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A SEMENTE DE HERODES
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05 abril 2019

Há no Céu um oratório salesiano. A porta está sempre aberta. O último a chegar foi Saged Mezher, um rapaz “muçulmano” da nossa escola de eletrônica: vem de um campo de refugiados de Dehesha, Cisjordânia. Estudava no colegial, quando os soldados entraram no campo para prender algumas pessoas: o desfecho foram violentos entrechoques a tiros. Difícil parar gente com fuzil-metralhadora na mão. A gente corria a esconder-se gritando. O grito dos feridos arranhava o Céu e o coração de Saged (que fazia parte do grupo de Pronto Socorro do Campo). Saiu da escola, botou o avental com a insígnia do grupo sanitário e correu para prestar socorro a alguns homens feridos que jaziam por terra. Tentava reerguer um deles, todo lacerado, quando um projétil furou o peito de Saged. Levaram-no ao hospital Hussein. Depois a um hospital especializado. Três horas agitadas de cirurgia... Tudo em vão: Saged morreu. A porta do oratório celeste estava aberta... : como os bem-aventurados do Evangelho, vive no coração de Deus.

Pouco antes chegara-me uma enxuta mensagem: «Dá vontade de chorar. Há dois dias - não se sabe por quê - à meia noite, botaram fogo em nosso dormitório das meninas, em Tonj, no Sudão do Sul. Apercebendo-se do fogo, as jovens fugiram para fora. Três delas entretanto não acordaram em tempo: foram queimadas vivas. Um ato intimidador contra nós ou talvez uma vingança tribal dos mesmos pais? No Sudão do Sul a vida vale menos do que o preço de uma rês! Ainda continua o princípio do “olho por olho”. Espera-se não venham consequências mais graves».

Metade das crianças e adolescentes do Planeta, lembra um relatório da OMS, sofre alguma forma de violência física, psicológica ou sexual. Não se fazem sequer pesquisas. Quase todos são liquidados como... “danos colaterais”, pequenos acidentes.

A mensagem do Papa, na Exortação Apostólica “Christus Vivit” (nn. 75-76) é clara:

«Não podemos ser uma Igreja que não chora à vista destes dramas dos seus filhos jovens. Não devemos jamais habituar-nos a isto, porque, quem não sabe chorar, não é mãe. Queremos chorar para que a própria sociedade seja mais mãe, a fim de que, em vez de matar, aprenda a dar à luz, de modo que seja promessa de vida. Choramos ao recordar os jovens que morreram por causa da miséria e da violência, e pedimos à sociedade que aprenda a ser mãe solidária. Esta dor não passa, acompanha-nos, porque não se pode esconder a realidade. A pior coisa que podemos fazer é aplicar a receita do espírito mundano, que consiste em anestesiar os jovens com outras notícias, com outras distrações, com banalidades».

«Talvez “aqueles de nós que levamos uma vida sem grandes necessidades não saibamos chorar. Certas realidades da vida só se veem com os olhos limpos pelas lágrimas. Convido cada um de vós a perguntar-se: Aprendi eu a chorar, quando vejo uma criança faminta, uma criança drogada pela estrada, uma criança sem casa, uma criança abandonada, uma criança abusada, uma criança usada como escravo pela sociedade? Ou o meu não passa do pranto caprichoso de quem chora porque quereria ter mais alguma coisa?” Procura aprender a chorar pelos jovens que estão pior do que tu. A misericórdia e a compaixão também se manifestam chorando. Se o pranto não te vem, pede ao Senhor que te conceda derramar lágrimas pelo sofrimento dos outros. Quando souberes chorar, então serás capaz de fazer alguma coisa, do fundo do coração, pelos outros.»

E o devemos fazer por todas as Pessoas Humanas, pequenas e grandes, que neste mundo são tratadas apenas como “coisas”. Porque sem dúvida um dos temores fundamentais é o de sermos tratados como coisas e não como Pessoas. Manipulados, impelidos de cá para lá por forças... impessoais, tratados como se nada valêssemos pelos que são mais fortes, que são superiores.

Cada um de nós pode ser um átomo minúsculo num incomensurável universo: mas devemos alimentar a ilusão de valer... Que a nossa individualidade chame a atenção. Ser completamente ignorados como pessoas é uma espécie de morte em vida: e contra isso nos obrigamos a combater COM TODAS as nossas forças.

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